Negacionismo climático * Claudio B. Guerra
- Águas e mudanças climáticas - Cláudio Guerra Notícias
- Dindão
- 31/05/2024
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Pesquisa realizada este mês pelo CGEE (Centro de Gestão e Estudos Estratégicos – ligado ao Governo Federal) mostrou que a maioria da população brasileira (95%) concorda que as mudanças climáticas estão realmente acontecendo e 78% delas acredita que suas causas estão relacionadas com as atividades humanas, conforme divulgado por diferentes estudos científicos em centenas de universidades no país e exterior.
Para cada 10 brasileiros, 6 acreditam que “corremos grave perigo” devido aos eventos climáticos que estão acontecendo na atmosfera do Planeta, isto é, “sobre nossas cabeças”.
A Bolsa de Valores de São Paulo já percebeu que a “conta chegou”: as análises do mercado financeiro já levam em conta e incorporam informações do clima nos métodos de análises e tomada de decisões, já que as mudanças climáticas impactam o transporte, saúde, meio ambiente, infraestrutura, economia, agronegócio.
O Presidente do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) Ilan Goldfajn disse estar preocupado com o que pode acontecer no futuro próximo e que hoje a questão das mudanças climáticas é uma prioridade do banco. Ele argumenta que é preciso estruturar os bancos multilaterais para atuar em emergências climáticas e que a estrutura de contingência tem 3 pilares: linha de créditos, suspensão dos pagamentos e até um “bônus catástrofe” durante o período de reconstrução da infraestrutura, casas etc.
É inaceitável que um dos mais importantes bancos do mundo não tome nenhuma providência ou pense em liderar ou estimular uma série de ações e medidas para combater as mudanças climáticas. O BID parece que está “esperando a ponte cair” para começar a liberar os recursos para sua reconstrução.
Enquanto isto, dois cenários preocupantes se nos apresentam:
1. A FEAM-MG (Fundação do Meio Ambiente) declarou que hoje, em Minas Gerais, temos 82 municípios com vulnerabilidade extrema, 115 com muito alta e 240 com alta a susceptibilidade à sofrer os efeitos das mudanças climáticos. O inimigo agora é outro: a seca.
2. O Projeto de Lei Federal de criação do Fundo Nacional de Mudanças do Clima continua “agarrado” no Congresso Nacional.
Para que Planos Climáticos articulados com estados e municípios funcionem num país continental como o nosso precisamos de recursos financeiros.
O que os gestores públicos, o empresariado, a mídia, a população em geral, estão esperando para iniciar ações, estudos, parcerias para colocar em prática Planos Climáticos em cada Estado, regiões metropolitanas, bacias hidrográficas, ou em áreas já detectadas como de alta vulnerabilidade ás mudanças climáticas?
Estariam eles aguardando um período de chuvas torrenciais que vai facilitar o rompimento de mais uma barragem de rejeitos da mineração em Minas Gerais ou por um período de seca e escassez de água de proporções inimagináveis na Região Metropolitana de Belo Horizonte?
O que podemos e devemos fazer frente ao fenômeno das mudanças climáticas? esperar a próxima catástrofe? O que a tragédia do Rio Grande do Sul nos ensinou?
É indiscutível que a omissão, desinteresse, indiferença, falta de iniciativa e de posicionamentos dos governos, nos seus 3 diferentes níveis, e do empresariado da 8ª economia do planeta, têm relação direta de responsabilidade com os fenômenos climáticos que devem ocorrer num futuro próximo.
Parece estar ocorrendo aqui um “negacionismo climático”.
Sugestão
Diante de um cenário difícil e da imobilidade da sociedade como um todo, mas principalmente dos governos, este colunista apresentou aqui uma sugestão de realização de um Seminário Anual Regional de Combate as Mudanças Climáticas por Estado, Região Metropolitana, ou bacia hidrográfica. A metodologia recomendada é aquela composta de Painéis Temáticos, com a participação de representantes dos diferentes segmentos sociais tais como órgãos governamentais, setor privado, da sociedade civil, das universidades.
Assim, a cada ano, será possível comparar onde ocorreram avanços e retrocessos na questão do clima.
Sabemos que se trata de um desafio que abrange vontade política e capacidade de mobilizar ações na velocidade necessária diante um cenário de aumento dos riscos de ocorrência de mais eventos extremos.
Concluindo, cabe lembrar aqui o caso em que, em setembro de 2023, seis adolescentes de Portugal entraram com uma ação na Corte Européia de Direitos Humanos reclamando que os países da Comunidade Européia estão violando seus direitos humanos e ameaçando seu futuro ao não tomarem medidas adequadas para combater às mudanças climáticas que estão nos levando para o aquecimento global. Para estes seis jovens, não há dúvidas: existe sim um “negacionismo climatico.”
* Claudio B. Guerra é consultor ambiental na bacia do Rio Doce nos últimos 30 anos. Fez o mestrado em recursos hídricos pelo UNESCO Institute for Water Education, em Delft, na Holanda.