O savânico e raro pica-pau-chorão

Caros leitores, vamos fechar esse ano com muita confiança num futuro melhor pra nossa Natureza, apresentando-lhes um pica-pau típico do nosso ameaçado Cerrado, o naturalmente raro pica-pau-chorão (Veniliornis mixtus). 

No Brasil está restrito a algumas áreas de savana, como o Cerrado e o Pantanal, ocorrendo também no Espinilho (mas sem ocorrência nos Pampas), numa estreita faixa dessa fisionomia que ainda resta nos municípios de Barra do Quaraí e Uruguaiana/RS. 

É um pequeno pica-pau (14 cm) que possui uma plumagem muito eficiente no quesito “camuflagem”. Outra curiosidade extraordinária não só dessa espécie, mas como de toda a família dos pica-paus, é que seus membros usam um método de comunicação muito peculiar, conhecido como “tamborilar”, que consiste em uma sequência de batidas que eles dão em troncos com seus fortes bicos e que é única para cada espécie, como se fosse uma impressão digital. 

Na nossa bacia, conforme a plataforma de ciência-cidadã Wikiaves, o pica-pau-chorão foi registrado somente em Ouro Preto, numa área que acredito ser de transição entre Cerrado e Mata Atlântica (tivemos a oportunidade de fotografá-lo em Ouro Preto, na primavera de 2012, guiados pelo grande amigo e ornitólogo Wagner Nogueira). 

Mais um dado biogeográfico que comprova que a serra do Caraça está totalmente dentro do bioma da Mata Atlântica, contrariamente ao que muito se diz por aí, que o Caraça tem áreas de Cerrado, ou seja, que é área de transição. 

Lembro-me de uma conversa (sempre de muito aprendizado) que tive com o maior especialista da Natureza do Caraça, o eminente ornitólogo Marcelo Vasconcelos, quando afirmou que o Caraça está totalmente inserido na Mata Atlântica, que o que o pessoal acredita ser Cerrado, na verdade são campos de altitude, fitofisionomia do bioma da Mata Atlântica, assim como temos por exemplo na Mantiqueira, Caparaó etc. 

Pelo mapa de ocorrência da espécie no Wikiaves, podemos perceber que Ouro Preto é o município mais a leste onde ele ocorre. Percebe-se claramente a serra do Espinhaço como limite geográfico dessa espécie, e não só dela, como também dos biomas do Cerrado e da Mata Atlântica. 

Outro fato interessante e que demonstra que essa espécie tem um alto nível de exigência ecológica é que diferentemente de outras espécies típicas do Cerrado, que tem ampliado suas áreas de ocorrência com a destruição da Mata Atlântica, como por exemplo o tucanuçu, a gralha-do-campo, entre muitas outras; o pica-pau-chorão não “invadiu” nossa bacia. 

Apesar do pica-pau-chorão não estar na lista de animais ameaçados (provavelmente por possuir uma grande área de ocorrência na América do Sul), espécies exigentes ecologicamente falando costumam ser mais suscetíveis à destruição do seu habitat. Mais um dos inúmeros bons motivos para preservamos nossas fantásticas formações savânicas.

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