Medo e revolta: Audiência Pública termina em confusão

Apesar do fim abrupto, comunidade deixou mensagem e demonstrou receio pelo fim da água

Uma Audiência Pública, realizada na noite de 16 de dezembro, no distrito de Morro d’Água Quente, em Catas Altas, após 1:49 horas de debates, foi encerrada abruptamente devido a um ato impulsivo de agressão de um morador a funcionário da Vale.

O evento foi realizado na Escola Estadual João XXIII e teria o objetivo da comunidade expressar para o executivo municipal se era ou não favorável ao empreendimento – Ampliação de Fazendão que abrange as localidades dos picos de São Luiz, Almas e Tamanduá.

O fato que acabou com a audiência se deu logo após o morador, identificado como Renato Bruno, concluir seu pronunciamento dizendo: “O que vou fazer aqui agora é pelas mais de duzentas pessoas inocentes, e crianças, que eu creio que quem fez nunca vão pagar, então eu também não vou pagar”, avançando sobre a mesa de trabalhos e agredindo Warly Delgado, funcionário terceirizado da Vale, que falaria sobre o licenciamento ambiental e que estava ao lado de Heloísa Oliveira, gerente executiva do complexo de Mariana.

O jovem foi contido por Bernardo Borba e entre outras pessoas que se encontravam no local.

Com o salão lotado, os funcionários da Vale presentes conseguiram sair rapidamente e a Polícia Militar entrou no local à procura do agressor, que fugiu pulando uma janela com cerca de 3m de altura.

O psicólogo da prefeitura, Rodrigo José disse que o morador já faz tratamento com ele e isso reflete o nível de estresse que vivem as populações no entorno das mineradoras.

Início tenso

A audiência pública, que, segundo representantes da sociedade civil organizada da cidade, seria apenas entre moradores e prefeitura, conforme edital, começou com os moradores indignados com presença da Vale, o que causou um tumulto e bate-boca entre moradores e o secretário municipal de Cultura e Turismo, Rodolpho Henrique de Oliveira Sanches, que presidiria a reunião. Ele foi criticado e acusado pelos moradores de “fazer o jogo da Vale”.

Representantes da Assetur (Associação das Empresas de Turismo de Catas Altas) acusaram Rodolpho de ter negado a participação da associação e convidado a Vale, sendo que a audiência seria apenas para a população se manifestar para o executivo sua posição quanto ao empreendimento.

“Apresentamos requerimento em tempo hábil junto à Secretaria de Meio Ambiente, que era uma das responsáveis pela Audiência Pública, mas tivemos a informação aqui hoje que o secretário de turismo negou nossa participação”, disse o presidente da Assetur Reginaldo Ferreira Tatu.

No início da AP, foi lido o edital onde questionaram que, em momento algum, informava que a Vale participaria, sendo clara o objeto da mesma, que seria entre comunidade e executivo.

Rodolpho até que tentou conduzir a reunião, dizendo que a Vale teria 30 minutos para apresentar o empreendimento, mas diante suas colocações, que inclusive ameaçou cancelar a Audiência, acirrou mais ainda os ânimos – “Sem água, sem vida, povo na mesa”, repetiam em coro parte da plateia.

Diante do impasse, Bernardo Borba passou a conduzir a reunião, chamando à mesa representantes políticos, de entidades, de moradores, da Vale, do MP, passando a palavra ao prefeito José Alves Parreira e ao vice-prefeito Fernando Guimarães.

Prefeito e vice se manifestam

O prefeito disse que estaria ali para dividir a responsabilidade de decidir sobre o empreendimento com todos os moradores: “Poderia ter emito uma certidão para a companhia, mas prefiro dividir com vocês essa responsabilidade”.

Já o vice-prefeito, disse que sua responsabilidade era maior pôr o mesmo ser morador daquela comunidade e deixou claro ser contra a intervenção nas localidades de Almas e Tamanduá: “Sabemos que temos que nos preocupar com a preservação dos nossos bens naturais, com a empresa e com os empregos e talvez eu seja o único político que já se posicionou dando minha opinião, a gente não é contra a mineração, precisamos dela, mas precisamos mais ainda de nossos bens naturais, não quero jamais sair daqui, expulso do Morro – se der pra conciliar, bom, mas a minha preocupação é a mesma da maioria da população aqui do Morro que é com a água, a água é vida, sem água não somos nada, estou muito preocupado com algumas colocações no EIA Rima da empresa”, finalizou arrancando aplausos dos presentes.

Dando sequência foi iniciado à explanação pelas entidades e moradores que se inscreveram, iniciando pela mesa.

Denúncias e críticas à Vale

Com o salão lotado, foi muito criticado a presença de muitos funcionários da Vale e ainda denunciado: “Eu como morador de Catas Altas e conhecedor aqui da comunidade de Morro DÁgua Quente, vejo muita gente desconhecida aqui e fiquei sabendo que a Vale dispensou o turno das 13 horas para que estivessem presentes nessa reunião”, disse Tiago Lafa, que destacou funcionários da Vale das cidades de Rio Piracicaba, Barão de Cocais, Santa Bárbara entre outros.

Sob ataques à mineradora e gritos de “Vale assassina”, os ânimos continuaram exaltados. Flávio Aparecido Gonçalves, 35 anos, disse que os moradores não podem nem mais tirar fotos das belezas da comunidade que ainda restam. “Você entra numa área que é da Vale, já aparecem um monte de seguranças e já vão chamar a polícia. Agora, a empresa pode entrar nas nossas terras, nas nossas propriedades e ainda demarcar o local”, disse retirando do bolso de sua camisa uma pequena placa que teria retirado de um ponto que a empresa teria colocado em sua propriedade e continuou: “Eu quando falo da Vale com a minha avó, de 95 anos, que mora na comunidade de Valéria, que fica a 8 km de Catas Altas, ela faz até o nome do Pai”, ironizou.

Quem também criticou a possível expansão da mina de Fazendão foi o morador Cláudio Barroso dos Santos, 40. “A Vale arruma emprego por três meses e manda a pessoa embora. Eu nunca precisei da Vale para comer. Vamos pensar nos nossos filhos, que estão indo para escola sem banho, porque já não está tendo água. Vamos arrumar melhoria para a nossa comunidade sem precisar da Vale, porque caso contrário, vamos morrer de sede”, afirmou.

A ambientalista Maria Tereza Corujo, a Teca, foi à audiência e fez um discurso pesado contra a empresa e direcionado também ao prefeito de Catas Altas, José Alves Parreira (PSDB). “Catas Altas com um potencial cultural e histórico belíssimo e é lamentável que o poder público não venha cumprindo seu dever de proteger esta comunidade. Prefeito, você disse que a Vale iria apresentar as ações. É viável? Isso é a primeira coisa que a Prefeitura tem que perguntar à comunidade. Não há nada que justifique destruir mais território onde já tem tantos problemas com a mineração. Se não se tem certeza absoluta que não vai causar impacto não se faça”, criticou.

Matéria m construção.

COMPOSIÇÃO DA MESA

Representantes da Vale Heloisa Oliveira, Gerente Executiva Complexo Mariana, Warley Delgado, da área de licenciamento, Promotor Márcio Ayala – convidado mas não compareceu, Fernanda Lage representando a deputada estadual Beatriz Cerqueira, Sandra Vita, representante da comunidade, Bernardo Coura presidente do Codema, Reginaldo Sales do Nascimento, Secretário de Meio Ambiente, Efigênia Magalhães Lopes, presidente do Compac, Rogério Tameirão, Arquiteto da Secretaria Turismo de Cultura, Rodolfo Sanches, Secretário de Turismo e Cultura e Libriele Rodrigues, Procuradoria Jurídica do município, Guilherme Fonseca do Movimento Serras, Flávio Aparecido Gonçalves, morador da comunidade e Tiago Lava, de Movimentos Sociais de Catas Altas.

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